terça-feira, 27 de setembro de 2011

Jade


Perto da costa, perto do mar, onde as águas verdes pareciam jade cintilando no horizonte, como se fizesse parte de um cartão-postal, à sombra de uma palmeira ele bebia água de coco sob o chapéu de palha ao sol das sete da manhã, catando conchas coloridas na espuma das ondas. Ao pôr-do- sol se atrevia a uma cerveja, olhando rapazes para sempre inatingíveis jogando futebol na areia. Tarde demais, nunca esquecia. E respirava lento, medido, economizando sua quota ao estufar estômago-costelas-pulmões, nessa ordem, erguendo suave os ombros para depois expirar sorrindo. Devocional, búdico. Pois se ficara mesmo tarde demais para todas as coisas dos Viventes Inconscientes, como passara a chamar às Pessoas do Outro Lado — apenas para si mesmo, não queria parecer arrogante —, pois se ficara mesmo assim tragicamente tarde, acendia um cigarro culpado e, fodam-se, com toda a arrogância constatava: se era tarde demais, poderia também ser cedo demais, você não acha? perguntava sem fôlego para ninguém. Navios deslizavam na linha verde do horizonte. Ele filosofava: se tarde demais era depois da hora exata, cedo demais seria antes dessa mesma hora. Estava portanto cravado nessa hora, a exata, entre antes-depois, noite-dia, morte-vida e isso era tudo e em sendo tudo não era boa nem má aquela hora, mas exata e justa apenas tudo que tinha. Entre este lado e o outro, isto e aquilo, um coco na mão esquerda e um cigarro na direita, sorria. Apoiado em coisas fugazes e ferozes, anjos e cães de guarda. Nada mau para um ressuscitado, considerou. E logo depois, insensato: estou feliz. Era verdade. Ou quase.

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